sábado, 29 de maio de 2010

Faculdade de Direito revoga portaria de atual reitor e acirra disputa na USP


Estadão


Em desafio a João Grandino Rodas - que dirigia a São Francisco antes de assumir a reitoria da universidade -, congregação de docentes demove atual diretor de renúncia e anula decisão polêmica que batizava salas de aula com nome de doadores


Carlos Lordelo, Carolina Stanisci - O Estado de S.Paulo

ESPECIAL PARA O ESTADO
Professores da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) revogaram ontem parte da última portaria publicada pelo ex-diretor da faculdade e atual reitor da instituição, João Grandino Rodas. Um dos itens do documento previa o batismo de duas salas com nomes de doadores, o que provocou protesto de estudantes. A revogação da portaria acirra a queda de braço entre a reitoria da USP e sua mais tradicional unidade.


Assinado por Rodas nos últimos dias de sua gestão, o documento previa a nomeação das salas com os nomes do advogado José Martins Pinheiro Neto e do banqueiro Pedro Conde. Também ordenava a transferência de livros da biblioteca para um prédio anexo ao da faculdade. Alunos e professores questionavam o procedimento de Rodas.

Nas últimas semanas veio à tona a existência de um contrato assinado entre os herdeiros de Conde e Rodas que vinculava a doação da verba à nomeação da sala com o nome do banqueiro. O documento, revelado pelo Estado, motivou a revogação da portaria em assembleia realizada ontem pela Congregação - instância máxima da faculdade. Para os professores, houve irregularidade, pois o contrato não foi encaminhado para anuência dos membros da Congregação e outras instâncias da universidade. Ao saber da revogação, funcionários retiraram as placas.

O clima de comoção imperou na reunião. Cinco seguranças ficaram do lado de fora da sala, enquanto cerca de 50 alunos aguardavam a decisão. O atual diretor da faculdade, Antonio Magalhães Gomes, chegou a anunciar que renunciaria ao cargo. Foi dissuadido pelos professores, que o aplaudiram de pé. Do lado de fora, funcionários faziam coro com os estudantes, gritando: "Fica, Magalhães."

"A faculdade vive um momento de crise", afirmou o professor de Direito Administrativo Edmir Netto de Araújo. "Fui a favor da revogação", disse, explicando que a existência do contrato reforçou a rejeição à nomeação das salas de aula.

Sobre a quase renúncia de Magalhães, Araújo disse: "Se ele renunciasse tendo o apoio maciço dos professores, o Rodas ficaria em uma situação bastante desconfortável no lugar que deu tudo o que ele tem."

Segundo o ex-diretor da unidade Eduardo Marchi, as doações para as reformas giraram em torno de R$ 2 milhões. "O curioso é que, no caso da sala que teria o nome de Pinheiro Neto, nem toda a verba veio do escritório, e sim de ex-alunos e professores."

Magalhães negou que tenha anunciado a renúncia após uma suposta pressão do reitor sobre a faculdade. "Estou desgastado e cansado", afirmou. Questionado se teria feito pressão, Rodas negou. "Pergunte para ele, para que ele responda. Nesse momento, é fácil dizer que o reitor fez isso e aquilo. Eu sempre o apoiei, apoio-o e vou continuar apoiando", declarou.

Estudantes da faculdade que apoiam o atual diretor comemoraram a decisão da Congregação. "A comunidade acadêmica não se calou diante da ilegalidade dos atos obscuros e antidemocráticos do ex-diretor", disse Renan Barbosa, de 19 anos, aluno do 2.º ano de Direito.

Processo. Ontem, a Congregação cogitava enviar ofício para o Ministério Público pedindo a abertura de processo por improbidade administrativa contra Rodas. Mas não houve consenso. Na reunião também ficou decidido que a faculdade não obedeceria a ordem da reitoria de não remunerar os funcionários grevistas da USP. / COLABOROU PAULO SALDAÑA, ESPECIAL PARA O ESTADO


CRONOLOGIA


Crise começou com biblioteca

23 de janeiro
Transferência
Livros da biblioteca são levados para prédio anexo, na Rua Senador Feijó, ainda em reforma.

3 de maio
Vazamento
Vazamento no prédio anexo teria molhado livros encaixotados.

7 de maio
Decisão judicial
Justiça acata pedido de liminar do MPF para retorno das obras ao prédio histórico.

12 de maio
Manifestação
Cerca de mil estudantes protestam no Largo São Francisco contra mudança da biblioteca e nomeação de salas.

13 de maio
Contrato
"Estado" revela contrato de compromisso de nomeação de sala entre Rodas e herdeiros do banqueiro Pedro Conde, assinado em abril de 2009. Professores consideraram o documento irregular.

27 de maio
Desmentido
Escritório Pinheiro Neto divulga nota afirmando que doação não previa contrapartida por Nomeação.

Fonte: O Estado de S. Paulo